A Grande Mudança Vocálica (Great Vowel Shift em inglês) foi uma grande transformação na pronúncia da língua inglesa ocorrida no sul da Inglaterra entre 1200 e 1600.A Grande Mudança Vocálica foi primeiramente estudada por Otto Jespersen (1860–1943), um linguista e anglicista dinamarquês, cunhador do termo.
Efeitos
Os valores das vogais longas constituem a principal diferença entre a pronúncia do
Inglês médio e do
Inglês moderno, e a Grande Mudança Vocálica é um dos eventos históricos que marcam a separação entre eles. Originalmente, essas vogais tinham valores "continental", como aqueles restantes na
língua italiana e no
latim litúrgico. Contudo, durante a Grande Mudança Vocálica, as duas vogais mais altas tornaram-se
ditongos e as outra cinco sofreram uma
elevação na articulação em relação às posições dos lábios e da língua, sendo que uma delas tornou-se uma
vogal anterior.
As principais mudanças (com as vogais mostradas em
IPA) foram,
grosso modo, as especificadas abaixo.
[3] No entanto, ocorreram exceções, e as transições nem sempre foram completas, algumas vezes sendo acompanhadas de mudanças na
ortografia:
- No inglês médio [aː] (ā) foi anteriorizada para [æː] e então elevada para [ɛː], [eː] e em muitos dialetos transformada em ditongo no inglês moderno para [eɪ] (como em make). Desde o inglês antigo ā sofreu uma mutação para [ɔː] no Inglês médio. Em inglês antigo, ā não corresponde ao ditongo do inglês moderno [eɪ].
- No inglês médio [ɛː] elevou-se para [eː] e depois para [iː] no inglês moderno (como em beak).
- No inglês médio [eː] elevou-se para [iː] no inglês moderno (como em feet).
- No inglês médio [iː] transformou-se no ditongo [ɪi], no que foi seguido muito provavelmente por [əɪ] e finalmente [aɪ] no inglês moderno, como em (as in mice).
- No inglês médio [ɔː] elevou-se para [oː], e no século XVIII isso tornou-se, em inglês moderno, [oʊ] ou [əʊ] (como em boat).
- No inglês médio [oː] elevou-se no inglês moderno para [uː] (como em boot).
- No inglês médio [uː] tornou-se muitas vezes o ditongo [ʊu], sendo isso seguido por [əʊ]; e posteriormente, no inglês moderno, por [aʊ] (como em mouse) no século XVIII. Antes de consoantes labiais, essa mudança não ocorreu, e [uː] continua como em room e droop).
Isso significa que a a vogal na palavra inglesa
date era em inglês médio pronunciada
[aː] (como em '´pá
); a vogal em feet
era [eː] (como em pê
); a vogal em wipe
era [iː] (como em escrito
); a vogal em boot
era [oː] (como em pôde
); e a vogal em house
era [uː] (como em computador
).
Os efeitos da mudança não foram inteiramente uniformes, e diferenças de graduação nas mudanças vocálicas podem às vezes ser detectadas em dialetos regionais tanto no inglês escrito quanto no falado, como por exemplo na fala de grande parte da
Escócia.
Exceções
Nem todas as palavras passaram por algumas fases da Grande Mudança Vocálica.
ea em particular não se tornou
[iː] em várias palavras, como
great,
break,
steak,
swear e
bear. Outros exemplos são
father, que não se tornou
[ɛː], e
broad, que acabou não se tornando
[oː].
O abreviamento das vogais em várias etapas produziu mais complicações.
ea é novamente um bom exemplo, comumente abreviado antes de
consoantes coronais como
d e
th, assim:
dead,
head,
threat,
wealth etc. (Este conhecido na história fonológica das vogais anteriores do inglês como
fusão bred-bread.)
oo foi abreviado de
[uː] para
[ʊ] em muitos casos antes de
k,
d e menos comumente
t, como
book,
foot,
good etc. Alguns casos ocorreram antes da mudança de
[ʊ] para
[ʌ]:
blood,
flood. De maneira similar, abreviações ainda mais antigas ocorreram em alguns casos contendo
ou:
country,
could.
Note-se que algumas palavras tomadas
emprestadas de outros idiomas como
soufflé e
Umlaut mantiveram a ortografia da língua de origem com o que pode parecer similar aos dos exemplos anteriores, mas uma vez que elas não eram parte da língua inglesa na época da Grande Mudança Vocálica, elas não são verdadeiramente exceções à mudança.
História
A surpreendente velocidade e a causa exata da mudança continuam sendo mistérios em na
linguística e na
história cultural, mas algumas teorias atribuem a causa à imigração maciça para o sudeste da Inglaterra após a
Peste Negra, onde a diferença de sotaques levou determinados grupos a modificarem sua fala de modo a permitir uma pronúncia padronizada dos sons vocálicos. Os dialetos diferentes e a ascensão de uma classe média padronizada em
Londres levou a mudanças na pronúncia, que continuaram a se espalhar a partir dessa cidade.
A súbita mobilidade social após a peste negra pode ter causado a mudança, com pessoas de níveis inferiores na sociedade que se deslocando-se para níveis mais elevados (a pandemia também atingiu a aristocracia). Outra explicação destaca a linguagem da classe dominante, a aristocracia medieval havia falado francês, mas no início do século XV, ela estava usando o inglês. Isso pode ter causado uma mudança para o "sotaque de prestígio" do inglês, fosse por tornar a pronúncia mais francesa no estilo, fosse por alterá-la de alguma outra forma, talvez através de
hipercorreção para algo pensado para ser "mais inglês" (a
Inglaterra esteve em guerra com a
França durante a maior parte desse período). Outra influência podem ter sido as grandes turbulências políticas e sociais do século XV, que foram em grande parte contemporâneas à Grande Mudança Vocálica.
Uma vez que a ortografia inglesa estava se tornando padronizada nos séculos XV e XVI, a Grande Mudança Vocálica é responsável por muitas particularidades da
ortografia inglesa. Ortografias que faziam sentido de acordo com a pronúncia do inglês médio foram mantidas no inglês moderno devido à adoção e utilização da
prensa móvel, inventada por
Gutenberg na
Alemanha por volta de
1440, e introduzida na Inglaterra nos anos 1470 por
William Caxton e depois por
Richard Pynson.
Outras línguas
As línguas
alemã e
neerlandesa também experimentaram mudanças de sons semelhantes aos da primeira fase da Grande Mudança Vocálica. Em alemão, nos séculos
XV e
XVI, o longo
[iː] transformou-se em
[ai], (como em
Eis, 'gelo') e o longo
[uː] em
[au] (como em
Haus, 'casa'). Em neerlandês aquele se tornou
[ɛi] (
ijs), e este que havia antes se tornado
[yː], tornou-se
[œy] (
huis). Em alemão também havia um
[yː] separado que se tornou
[oi], via um intermediário similar ao neerlandês.
O alemão, como o inglês, também modificou o fonema comum germânico
*[oː] para
[uː], como no
Proto-Germânico *
fōtuz 'foot' > alemão
Fuß (assim como os raros e secundários
*[eː] para
[iː]). Esta semelhança, porém, acaba por ser superficial em uma inspeção mais minuciosa. Devido às enormes diferenças entre as estruturas do inglês antigo e a fonologia vocálica do alto alemão antigo, isso é surpreendente. Não há nenhuma indicação de que aconteceu alguma coisa às vogais longas do inglês que não
[iː uː], mas apenas que se moveu a posição da língua (não há qualquer indício, por exemplo, das características ditongais das modernas
bee, bay, bone em nenhum dos manuais
ortoépicos (pronúncia) dos séculos XVII e XVIII). Em alemão, o processo foi totalmente diferente, e aconteceu muito antes que os desenvolvimentos ingleses: já nos primeiros textos em
Alto alemão antigo (
século IX) a vogal em questão é consistentemente escrita -
uo-. Ou seja, havia sido "quebrada" em um núcleo com um centro
semivogal. Esse complexo núcleo "suavizado" como o termo tinha em
alto alemão médio, tornou-se
[uː] em alemão moderno por volta da mesma época qie as vogais longas ditonguizadas. O
[oː] do alemão moderno possui origens variadas, a mais antiga é a proto-germânica *
aw, suavizada antes de /t d r x/ (como em
rot 'red',
Ohr 'ear',
Floh 'flea', etc.) Em outras palavras o som era escrito -
ou- em alto alemão antigo. A semelhança original *
ai tornou-se
[eː] antes /r x w/, permanecendo o que era escrito -
ei- em outras. Em alguns dialetos do alemão /ou ei/ permanecem diferentes desses novos ditongos, mas em alemão padrão eles contraíram-se nos os recentemente criados /au/ e /ai/, respectivamente. Esse último ainda é, de maneira um tanto quanto excêntrica, escrita -
ei- como regra, uma relíquia dos tempos em que /ei/ era o único ditongo. Por outro lado, a ortografia alemã manteve-se muito mais consistente que a do inglês.